Como lidar com um filho que pratica bullying?
Da conversa franca à participação em projetos de voluntariado, especialistas recomendam sempre firmeza e amor
Clarissa Passos, iG São Paulo | 21/07/2010 12:10:13
Observação constante: pais devem conhecer a vida social dos filhos e manter o diálogo aberto para corrigir o bullying
Em
setembro de 2004, três estudantes adolescentes de Carazinho, cidade de
cerca de 60 mil habitantes no Rio Grande do Sul, criaram um fotolog com
fotografias alteradas digitalmente. O alvo das fotomontagens era um
colega de classe dos três - que, ofendido com o que os autores
consideravam só uma "brincadeira", entrou com um processo por bullying
contra o provedor do fotolog e o responsável pela conta de onde partiam
as postagens - no caso, a professora Solange Ferrari, mãe de um dos
garotos do grupo.
Três
anos depois, em dezembro de 2007, Solange foi surpreendida por uma
intimação. "Nem sabia do que se tratava", relembra. Ela telefonou para o
filho, que já havia atingido a maioridade e morava na Itália. "Foi aí
que ele me explicou", conta ela. Solange, que mal sabe postar um foto na
internet, foi condenada este mês em segunda instância, em decisão
inédita no estado. Ela deve pagar R$ 5 mil de indenização, corrigidos, à
vítima de bullying - que hoje estuda não só na mesma universidade que o
filho dela, como também na mesma classe. "Eles não se falam e meu filho
diz que o que ele mais sente é o fato de eu ter de pagar por algo que
ele fez".
Solange,
que recorreu da decisão, lamenta que um jovem com idade considerada
suficiente para escolher os governantes não seja responsabilizado pela
Justiça. "Se eu tivesse sido informada da história, teria tomado as
providências necessárias", declara. Certamente ela seria mais rápida que
a Justiça, mas quanto à responsabilidade da condenação, sob o ponto de
vista do Código Civil, não há dúvidas: o artigo 932 enuncia que "são
também responsáveis pela reparação civil os pais, pelos filhos menores
que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia". "É bem claro: do
ponto de vista da lei, os pais são responsáveis pelos atos dos filhos",
diz o promotor Lélio Braga Calhau, autor do livro "Bullying: o que você
precisa saber" (Editora Impetus).
Antes que os casos cheguem aos tribunais, o que os pais podem fazer quanto aos filhos que praticam o bullying?
Para o psiquiatra e terapeuta Içami Tiba, os pais devem tomar medidas
sérias quando descobrem que o filho pratica bullying. "Eles precisam
impor consequências. Não adianta só papo. Precisa ter ação", recomenda
ele, que sugere a ida a trabalhos voluntários com a criança. O tipo de
trabalho pode ser escolhido de acordo com a idade do seu filho: os mais
novos podem visitar creches para brincar ou ler histórias para as outras
crianças. Adolescentes podem ajudar a fazer sopa para os sem-teto.
Içami Tiba: "os pais devem tomar medidas sérias, aliadas à ação"
Içami
descarta a matrícula em uma atividade física mais puxada ou mesmo em
uma academia de luta ou artes marciais, caminho escolhido por muitos
pais que consideram essa uma boa solução para "canalizar" a
agressividade do filho. A conversa sempre é boa, mas a ação deve ser
eficaz e compete aos pais. "O que não pode é deixar barato", alerta
Içami, autor de "Adolescentes: quem ama, educa" (Integrare Editora),
entre outros títulos voltados para educação e desenvolvimento.
O amor não muda
Muitos pais entendem o bullying como uma qualidade, confundindo
agressividade com um comportamento de liderança. "Já estive em reuniões
de escolas em que o pai, ao saber das atitudes do filho, dizia que ele
era um 'líder', enquanto que as outras crianças eram 'babacas'",
testemunha o pediatra Aramis Antonio Lopes Neto, autor de "Diga não ao
bullying". "Os pais precisam entender que aquilo é um problema para
então conversar com os filhos, conhecer a vida social deles", explica.
Algumas
vezes, o comportamento agressivo é desengatilhado por experiências
traumáticas, de violência familiar ou social, como discussões entre os
pais, separações na família, um sequestro ou um assalto. Nestes casos,
Aramis sugere o acompanhamento terapêutico para a criança. Mas para ele,
impedir o bullying é uma questão de conscientização que deve ser feita
pela escola e pelos pais. "Pais que lidam com filhos que praticam
bullying devem deixar muito claro que o amor deles pela criança ou
adolescente não muda, mas que eles absolutamente não aprovam esse tipo
de comportamento", defende. "Ele pode ter se tornado agressivo porque
tem um problema, então não pode ser marginalizado por isso", finaliza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário